quinta-feira, 16 de julho de 2009

Fazendo o Futuro

Conversa com Alamir Penna Gonçalves, mais conhecido como Alamir do Vime, aluno do 6º ano da EJA.

Seu Alamir contou a historia de como foi morar nas ruas após uma crise de depressão depois da morte de um ente querido.

Como o senhor saiu das ruas?

“Eu consegui quando alguém chegou para mim e me pediu ajuda para fazer um jardim. Foi em sete de setembro de 1985.”
“Fui no dia seguinte, a pé até São Francisco. Ele não me pediu para tomar banho, nem para mudar de roupa. No final do trabalho, à tardinha, ainda me deu cinco cruzados. Eu perguntei se podia voltar no outro dia, e acabei ficando uns quatro dias. No terceiro dia ele me perguntou se eu queria trocar de calça para trabalhar (olha só a esperteza, ele não me ‘deu’ uma roupa, ele valorizou a que eu tinha!).”
“No dia onze eu tomei meu primeiro banho em muito tempo. Foi na rodoviária, a água estava muito quente. O pessoal zombava: Ih, vai incendiar a rodoviária!”
“Aí fui crescendo. Quinze dias depois voltei a trabalhar na minha profissão.”

Como o senhor começou a trabalhar com os outros moradores de rua?

"Foi meio sem querer. Eu trabalhava com vime ali em Icaraí e via os pivetes abordando os garotos que voltavam da escola, ameaçando e pegando as coisas deles. Um dia pedi a um para comprar um biscoito, ele foi e me deu o troco direitinho. Então comecei a fazer amizade com eles e pedi para me ajudar. E comecei a dar comissão a eles. Nunca aconselhei: não faz isso, isso ta errado.”

Seu Alamir faz uma ressalva quanto às críticas. Diz que quem faz uma crítica, se sente superior, e isto fere quem é criticado. Por isso, ele acha que não há crítica construtiva. Para ele, apontar o erro não é bom, pois desvia do objetivo principal. E ilustra o que pensa desta forma:

“Quando você vai atravessar a pinguela, tem que olhar para frente. Não se deve criticar ninguém, mas mostrar o que é bom para ele. Tem que mostrar, mas com jeitinho. Não pode criticar para não confrontar, o que é ruim ele já conhece.”


No meio de nossa conversa, Seu Alamir mostra as fotos dos meninos que ajudou a sair das ruas. Diz onde estão agora, trabalhando, estabelecidos e com futuro. (Eles estão sorrindo nestas fotos). Mostra também pequeno cartaz de um menino cuja família está a procurar, e que está empenhado em ajudar: ele sabe a dor da família que tem um ente querido “perdido” nas ruas. Ele reafirma sua historia diante dos demais, espera poder auxiliar o menino e sua família.

“Não tenho vergonha de falar sobre o que eu era. Todo aquele que esquece o seu passado, está condenado a repeti-lo. Hoje sou feliz, com minha esposa e meus filhos, estou aprendendo a conviver com os meus problemas.”


Sobre sua família, Seu Alamir é só elogios: o filhos são bons e a esposa é amiga, companheira e o ajuda muito, um Mulherão – como ele fez questão de demonstrar quando a professora Audrey pediu para fazer um trabalho (linha da vida) sobre uma mulher importante da historia: sua esposa foi a escolhida.
Seu Alamir gosta de falar, como ele mesmo afirmou. E com tanta coisa para contar, perguntei-lhe se já havia pensado em escrever um livro.

“Já. Por isso voltei à escola. Eu tentei, mas tenho muitos erros de Português.”


Ele havia pedido a ajuda de alguém que veio a falecer. Então sugeri que escrevesse com a ajuda do computador. Seu Alamir aprova a idéia com entusiasmo - já havia inclusive pensado nisso! (Quem sabe daqui a pouco ele não estará escrevendo suas vivencias e seus saberes na forma de um blogue...)
Sobre seus antigos e atuais problemas, Seu Alamir comenta:

“A depressão é um caso serio, tem que tomar cuidado. Tem que fazer acompanhamento, seguir a orientação do médico.”


Mas, resumindo o que ele pensa sobre problemas, seu jeito próprio de ser e ver o mundo, transcrevo aqui o que ele disse ainda no começo da nossa conversa:

“Feliz quem tem problemas. Só os mortos e alienados não os têm. Se a gente tem problema, tem vida.”


Que a historia de seu Alamir possa servir de exemplo e ajudar a muita gente...

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